6 de maio de 2004

Pé na jaca, na lama, nos quintos dos infernos
Se eu não fosse este rapaz educado que todos conhecem, não hesitaria em escrever um belo de um "Fodeu!" no título deste post. Como sou este sujeito ajuizado e meio bundão que vocês conhecem, arquivo o "Fodeu!" e fico com um mero "pé na jaca". O assunto, claro, são as estripulias dos soldados norte-americanos no Iraque. Não bastasse a competência do governo Bush ser questionada, a eficiência da ocupação e o suposto sumiço das armas de destruição em massa (que, diga-se de passagem, existem; ou será que Saddam Hussein exterminou os curdos a base de paus e pedras?), agora desce-se aos portões do inferno, definitivamente.
Era de se esperar que os atentados terroristas de 11/9 levassem os EUA a uma série de medidas que restringissem o ir e vi dos cidadãos e sua privacidade, jogando por terra boa parte da ideologia que faz com que o país seja admirado e/ou odiado. Mas talvez nem os terroristas imaginavam que conseguiriam ir tão longe no convite que fizeram às chamadas democracias ocidentais: "vem cá nos encarar, babacas! Mas para nos derrotar vai ter que usar de terror também, mané!". E não é que os idiotas foram? Agora que se vêem num lamaçal sem perspectivas de resgate a curto prazo, Bush e cia. se desculpam de olhos nas ?eleições, promovem uma suposta devassa a procura dos soldados que cometeram os crimes. É de se perguntar se esta prática é a regra ou a exceção; ou, pior, nem uma coisa nem outra, mas uma atividade (explico: tortura, humilhação, sevícias sexuais...) medianamente popular e tolerada pelos oficiais.
A triste história das vitórias bélicas e das ocupações não deixa margens para otimismos. Os aliados bombardearam inutilmente a população civil berlinense com uma fúria que destoava do "nobre ideal" de derrotar Hitler e seus asseclas. Neste momento, igualaram-se, desprezando aqueles a quem juraram proteger. No final, é claro que Hitler teve o fim que merecia, mas as máculas do conflito são quase-segredos que poucos ousam mencionar abertamente. Da mesma forma, a imagem de uma União Soviética triunfante, tomando o outro lado de Berlim para si é de uma falsidade aterradora - sabe-se hoje que praticamente toda a população feminina sobrevivente foi estuprada por soldados russos bêbados; muitas até a morte, por dezenas de homens. Como diz o ditado, de 8 a 80 anos, todas foram vítimas da mesma fúria.
Por que acreditar que seria diferente no Iraque? E agora, como os conservadores e alguns liberais vão sustentar a teoria da ocupação relativamente tranqüila do país, com conflitos isolados (porém ferozes) e uma população recém-conquistada pelos norte-americanos? Como dizer a outros povos árabes, a duras penas parcialmente convencidos pelos homens de Washington nos últimos 30 anos, de que os homens do lado de cá não são tão ruins quanto parecem?
É um atoleiro do qual nem a eleição poderá tirar os EUA. Não se trata apenas do governo Bush, mas de uma situação insustentável e sem solução - a não ser com o abandono do país ocupado a sua própria sorte.
Durma-se num atoleiro destes.

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