24 de março de 2004

Ainda sou de Madri
13 dias atrás, num 11 de março, mais de 200 pessoas morreram no maior atentado terrorista da história da Europa. Não me interessa aqui fazer uma tentativa tosca de análise do que ocorreu - até porque já houve um sociólogo brazuca influente e importante insinuando que os EUA têm os dedos sujos na história... francamente, dr. Sader! - ,mas me ocorre que escrevi o seguinte aqui mesmo, em agosto de 2003 :

Terrorismo é palavra que descende do Terror pós-revolução francesa, se eu não estiver falando uma imensa besteira. É, antes de mais nada, uma política de manutenção do medo, de desestabilização do inimigo. Seus meios variam, mas em geral associamos a palavra aos atos violentos cometidos em nome da política, religião, ideologia, o escambau. Todo ato terrorista tem uma mensagem implícita e, não importa sua validade (da mensagem), todo ato terrorista é um crime contra o homem. Ponto final.
Entretanto, o terrorismo jamais será vencido. Porque mesmo que sejam punidos os terroristas (eles merecem punição, sim) e atendidas as reinvidicações justas, sempre haverá aquele que acreditará que a aceitação dos atos "benevolentes" do inimigo foi uma traição, uma indignidade. Este fundará outro grupo e continuará seu trabalho. Mixando auto-mitificação com auto-engano, seu discurso sempre arrebanhará seguidores, quase sempre ainda mais "engajados" do que a geração anterior de acólitos.
Uma vez implantado o medo, ele não sai tão facilmente. Quantas gerações de nova-iorquinos temerão por suas vidas, que podem ser abreviadas num momento de algum dia qualquer? - nem precisa ser 11. Israelenses, palestinos, indonésios, hindus, todos subjugados pelo medo. O objetivo do terrorismo não é matar - esta é uma das formas de ação. Com a tragédia, ele impõe sua ordem e se torna mais forte do que o Estado, atônito, incapaz de proteger os cidadãos de uma ameaça que anda ao lado deles.
É por isto que o terrorismo acaba vitorioso, mesmo depois de derrotado.


Não há um único inimigo articulado e imenso, como quer nos fazer acreditar a retórica dos Bushs e Rumsfelds da vida, mas uma rede de organizações, unidas por conveniência, aliciando membros dissidentes aqui e ali para fazerem o trabalho sujo. Gente que conhece e usa bem a tecnologia. A Al-Qaeda é apenas uma delas, talvez a principal, e a de maior visibilidade até então. E, ao contrário do que dizem as especulações sem provas dos teóricos de conspiração com diploma universitário, o mais provável é que seja mesmo a Al-Qaeda a mentora do ataque em Madri.
O uso político do atentando para acusar o ETA acabou custando a reeleição para Aznar. Resta agora saber se os socialistas vencedores conseguirão gerenciar a Espanha pós-11 de março e articular com o restante da Europa as medidas de segurança que, inevitavelmente, virão a seguir.
De qualquer forma, se somos de Madri no momento do choque, do horror e da indignação, que sejamos também no exemplo - poucas horas após os atentados, havia tanta gente doando sangue que os serviços de atendimento às vítimas tiveram de pedir o fechamento dos postos, que operavam além da capacidade e da necessidade.

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