27 de dezembro de 2003

Ainda o Natal I : Bobagens sérias
“Os melhores votos de um feriado do solstício de inverno ambientalmente consciente, de baixo estresse, sexualmente neutro e comemorado nas melhores tradições da religião de sua escolha, mas sem pressupor que você tenha uma opção religiosa e ao mesmo tempo respeitando a opção religiosa dos outros ou a opção deles de não participar de absolutamente nenhuma religião.”
Isto que você leu é uma mensagem de Natal escrita por um professor da Universidade Washington, em Saint Louis, EUA. Sim, eu sei que não parece, mas é. Atualmente, os norte-americanos evitam dizer Merry Christmas para não ofender pessoas de outras religiões e/ou sem opção religiosa. É o inferno politicamente correto.
A idéia que os paranóicos intelectuais do norte têm de tolerância religiosa é uma maquiagem lingüística simplória. Não passa de um conjunto de regras dizendo o quê dizer, como agir, com o intuito de evitar ao máximo ofender ao próximo, a suas crenças, suas opções. Que termos naturalmente pejorativos como niger (não há como traduzir; algo como “criolo”) sejam evitados, certo, não reclamo disto. Daí a instituir uma ditadura de costumes, uma sociedade em que todos vigiam a todos e cobram uns dos outros atitudes ensaiadas, decoradas, pateticamente falsas, a isto dou o nome de “auto-engano coletivo”. O caso do Natal é emblemático. Esta reportagem da BBC Brasil é que chamou a minha atenção para o problema.
Afirmo novamente: Não é a recusa de conviver com as particularidades de cada religião que tornará este mundinho complicado mais aceitável, mas exatamente o reconhecimento destas diferenças e seu espaço de expressão, que pode muito bem ser o mundo todo. Quando alguém de outra religião deseja a mim algo relacionado a suas crenças mais íntimas, ele não me ofende (mesmo que eu não concorde com um pingo do que ele acredita), na verdade ele está me chamando de irmão. Ele quer que sua fé seja grande o suficiente não para si, mas para o mundo. É um ato de generosidade, não de imposição ou ofensa. E já ouvi coisas que considerei estranhas, bizarras mesmo, mas ouví-las com sinceridade vindo de quem realmente acredita nelas me fez acreditar mais no homem.
O politicamente correto quer substituir a espontaneidade da vida, seus conflitos, glórias e clichês numa ditadura de intelectuais e pseudo-intelectuais, numa cápsula em que compiladores de termos “adequados” reeducam a socidade à sua (pobre) imagem e semelhança. Pergunto-me se o politicamente correto não é uma força ainda mais perversa do que a “globalização” na universalização dos costumes, na transformação da diversidade humana numa pasta insossa facilmente reconhecível por qualquer habitante de qualquer muquifo do planeta.
Por isso, digo aos norte-americanos: MERRY CHRISTIMAS, com toda a carga religiosa que este cumprimento possa ter. E desejo sinceramente que em 2004 eles sejam menos chatos e francamente menos frescos. E, por favor, dêem um jeito no politicamente correto antes que este negócio se transforme numa ditadura.
Amém.

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