1 de novembro de 2003

Reflexões, explosões e (muito!) sangue

Dificilmente eu sairia de casa para assistir a um filme como Freddy x Jason. Também o Exterminador do Futuro 3 não me despertou interesse suficiente para encarar uma sala de cinema. O curioso é que acabo de ler interpretações, no mínimo, generosas, em dois jornais – O Estado de Minas e o caderno Mais! da Folha de São Paulo – sobre ambos.
No Mais!, Jorge Coli, historiador de arte, escreve sobre o Exterminador 3: “O tema clássico do humanismo ameçado pelas máquinas toma nova espessura, muito complexa, instaurada pelo dever e pela culpa, pela escolha, pela contradição.”. E eu, pobre mortal, achava que a franquia Exterminador era apenas um caça-níqueis (dos bons, reconheço) do cinemão americano. Coli merece crédito por sua visão do cinema de espetáculo sem os típicos preconceitos intelectualóides a que estamos acostumados a ler. Não faz muito tempo, ele elogiou um anime (para quem não sabe, é o nome que se dá aos desenhos animados japoneses), Vampire Princess Myiu. Não deve ser muito bem visto no meio dos pedantes ou ninguém leva muito a sério o que ele escreve. Sua capacidade de enxergar inteligência e reflexos das inquietações humanas até no mais desavergonhadamente comercial filme norte-americano encontra eco nos artigos de Marcelo Castilho Alencar, que escreve regularmente para o jornal Estado de Minas. Talvez ele tenha exagerado ao meter Nietzsche no meio de Freddy x Jason, comparando os dois psicopatas mais famosos do universo paralelo que são os filmes para adolescentes do cinema lá de cima, aos conceitos de Dionísio e Apolo, centrais na obra do alucinado de Turim. Na verdade, já deu nos neurônios esta devoção dos intelectuais daqui ao bigodudo, em especial esta mania de querer classificar todo e qualquer fenômeno como apolíneo ou dionisíaco. Neste caso, Jason seria Dionísio, irracional, impelido pelos instintos; Fred seria Apolo, racional, manipulador. No meio dos dois, um bando de jovens morrendo sempre que fazem sexo ou tomam drogas – ei, esta é a regra número dois do cinema de terror impúbere, segundo seu mestre, Wes Craven.
Cinemão pensante? Ué, por que não? É muito provável que nenhum dos roteiristas tenha pensado nestas questões ao montar suas tramas, mas a existência destas tensões nos filmes só mostra que certas questões universais pipocam onde menos se espera. Não se pode negá-las aplicando rótulos fáceis e intelectualmente atraentes na cultura pop ou reduzindo-a a uma análise sociólogica de marxismo rasteiro – que é o que mais se faz por aqui.
Coli encerra seu artigo pisando no acelerador, exagerando um pouquinho, mas, apesar disto, acertando ao afirmar: “Basta afastar preconceitos ou hábitos mentais para perceber a inteligência reflexiva presente no cinema de ação americano. Essa força não depende de intenções expressas. Brota no contar de uma história, no fazer-se espetáculo.”
Bom, mas mesmo depois disto tudo, você gostaria de saber se eu mudei de idéia e se vou assistir a Freddy x Jason? Hã... Nãããããããããããããããããããããããããããããããããããããooo...


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